Saí pelas ruas, desorientado, triste e procurando uma solução suficientemente racional para todos os meus problemas. Como era de se esperar, não foi lá que eu encontrei resposta alguma. Então, logo retornei a minha residência.
Como de costume, entrei pela cozinha, abri a geladeira e fui caminhando pelo corredor. Entrei no banheiro e logo tive uma surpresa: dei de cara com dezenas de pessoas! Ainda que eu não me lembre muito bem de todas elas, tenho em mente o que a face de algumas delas expressava e, de alguma forma, eu sabia o que aquelas pessoas sentiam.
A primeira delas era sorridente. Parecia sempre feliz e pronta a ajudar qualquer um que aparecesse em seu caminho com algum tipo de problema. Era uma pessoa alegre e que fazia o possível pra agradar seus amigos e amores. Brincava com quem lhe dava uma brecha, se divertia com seus amigos e era um tanto quanto inteligente. Tinha uma auto-estima e um otimismo bastante elevados e conseguia, sabe-se lá como, compartilhar dessas qualidades da vida com os amigos, que sempre que podiam, o rodeavam e gostavam sempre de estar perto dela.
A segunda e a terceira pessoa que logo vi guardavam certo ressentimento nos olhos, mas ainda assim, pareciam felizes e partilhavam de muitas das características da primeira. Porém, de todas as características, elas não possuíam a mais preciosa, a auto-estima. Olhei com firmeza e elas revidaram, logo, foram denunciadas pelo olhar: sua auto-estima havia sido, de alguma forma, roubada. Senti-me triste, procurei outra pessoa para focar minha atenção.
Avistei a quarta e ultima pessoa que me foi possível. Esta, Deus do céu, carregava no olhar um sentimento de tristeza contagiante. Seus olhos diziam o quanto ela estava mal e o quanto parecia insatisfeita com a situação de vida em que se encontrava. Esta parecia ter as mesmas qualidades da primeira, porém, era claro que absolutamente todas elas haviam sido retiradas de sua personalidade. A sua face era tão cabisbaixa que senti, como nunca, uma dor no peito absurda. Tirei o foco dela e prestei atenção em todos de uma só vez.
Ao olhar a multidão, percebi uma movimentação de todas as pessoas que ali estavam. Elas começaram a se encarar e brigar. O mais assustador é que todas elas foram para cima de uma só, a primeira que eu havia focado. A que mais tinha a intenção de derrubá-la era a quarta pessoa, a mais triste. Contudo, a primeira se equilibrava entre uma agressão e outra e conseguia se sustentar mesmo que, como dizia minha avó, aos trancos e barrancos. Aquela cena me deixou desorientado. Eu senti uma agonia imensa, mas não me parecia uma boa idéia tentar ajudá-la a combater tantas outras pessoas a agredindo. Sem saber o que fazer, chorei e gritei. Ninguém me ouvia e logo fiquei mais desesperado.
Na tentativa inútil de acabar com meu sofrimento, esmurrei a mão contra aquela cena. Chorando, vi cacos em cima da pia e sangue escorrendo de meus dedos. Lavei-os e fui me deitar. Ainda sem conseguir cessar o choro, dormi.
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