sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Lágrimas Sofridas



O sol já tinha se posto enquanto eu carregava as compras da madame. Eu passava o dia inteiro andando por todos os cantos da cidade levando as encomendas. A vida não era muito boa, muito menos o salário. Pelo menos dava pra manter o barraco e sustentar minha Paula.

Paula, minha filha querida, a melhor coisa que Deus me deu. Fiz o melhor pra ela, pus em escola, em cuso de informática e inglês. Ela sabe tudo, vai ser patroa.

Naquele dia era aniversário dela. Uma semana antes eu já tinha visto um cordão numa loja bonita. Não era de ouro nem o mais caro, mas era o que eu poderia pagar com as gorgetas que eu ia ganhar.

Foi então que eu levei as últimas compras. Deixei a madame com as sacolas e um sorriso, ela me retribuiu com umas moedas e um ar de desdém. Estou acostumado. Pelo menos o dinheiro que ela deu foi suficiente pra completar o preço do cordão.

Cheguei em casa com o embrulho lindo, dourado, a cara da Paulinha.

Não encontrei ninguém. Em cima da mesa vi um bilhete:
"João; cansei dessa vida, não nasci pra isso. Nasci pra crescer, brilhar. Não quero ficar aqui e ser igual a você: um coitado que vive da esmola dos outros, se conforma, não quer crescer. O que você me deu até agora foi pouco, quero mais. Quem pode me dar o que eu quero é o Maurício. A partir de hoje vou poder ser patroa. Adeus. Paula"

Sempre soube que ela ia sair do barraco, mas não assim. Ensinei ela a querer ser alguém, ser tudo o que eu não pude ser, mas esqueci de ensinar ela a ser humilde e amorosa. Ela não percebeu que o meu amor por ela era maior do que a minha preocupação comigo. E ela me tratava com desdém, igual à madame, igual a todo o mundo.

Não sabia viver sem ser por ela. Fui pro bar. Bebi. Cantei. Dancei. Vivi sem a obrigação do amor por algumas horas. Não sei viver assim. Chorei. Me joguei na lagoa. Me inclinei à morte sem receio. Morri.

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